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Renovando falências e recuperações


Está tudo pronto para que a Câmara comece a votar, esta semana, a proposta que altera as regras de recuperação judicial e falência de empresas. As mudanças chegam em boa hora diante de um cenário econômico desfavorável para a saúde financeira das companhias depois do longo período de recessão provocado pela pandemia do coronavírus.

O deputado Hugo Leal (PSD-RJ), relator da proposta, apresentou seu parecer no dia 18, com alterações que modernizam e dão mais celeridade aos processos depois de 15 anos de vigência da Lei de Falências e Recuperação Judicial. De uma forma mais ampla, o novo projeto incorpora a possibilidade de financiamento na fase de recuperação judicial, a apresentação de plano de recuperação por credores, a reclassificação dos créditos e o parcelamento de dívidas tributárias federais. O deputado Hugo Leal cria a possibilidade de o devedor em recuperação judicial fechar contratos de financiamento, incluindo bens pessoais em garantia, para tentar salvar a empresa.

O conjunto substancial de propostas abre um novo horizonte de salvaguardas para as empresas em dificuldades. E são muitas hoje, mais ainda no futuro. Calcula-se que entre 2 mil e 3,5 mil companhias devem recorrer à Justiça este ano para conter a cobrança dos credores por dívidas em atraso, bem acima do recorde de 2016, que era de 1.863. Especialistas preveem que 80% dos pedidos de recuperação judicial devem partir das pequenas e médias empresas. Entre janeiro e junho, elas já somavam 120 processos de acordo com a Serasa Experian, um aumento de 55% em relação ao mesmo período do ano passado.

A Covid-19 atingiu em cheio especialmente o caixa dessas empresas. Com mais dificuldades em levantar recursos no mercado financeiro, por não ter muitas garantias a oferecer, tendem a recorrer à falência, antes mesmo de pensar em recuperação judicial. Os ajustes propostos na lei não vão resolver todos os entraves enfrentados por estes pequenos e médios negócios - o processo de recuperação ainda é caro --, mas o setor está no radar dos parlamentares e deve ganhar mais fôlego.

Há, contudo, muitos outros obstáculos que o novo projeto vai ajudar a superar. Se há 15 anos, a proposta aprovada modernizou a lei de falências e abriu as portas para a recuperação judicial, o texto atual embute outras inovações. Fortalece a negociação extrajudicial, reduz o poder do Fisco para disputar recursos na massa falida, dá garantias a investidores para manter abertas linhas de crédito para empresas em recuperação e entra em sincronia com as regras internacionais aplicadas a multinacionais. Este último item, por exemplo, evitaria que o braço brasileiro da companhia aérea Latam tivesse de entrar com pedido de recuperação na Justiça americana, mais ágil e favorável que o brasileiro.

Vale ressaltar que a negociação extrajudicial estava prevista na lei aprovada em 2005, mas as execuções das dívidas não eram interrompidas enquanto credores e devedores debatiam. O relatório apresentado pelo deputado Hugo Leal propõe a suspensão dessas execuções durante 60 dias para dar mais tempo para as partes entrarem em consenso. Com o acordo feito, cai também o quórum para aprovar o plano de recuperação extrajudicial, de 60% dos créditos de cada espécie para mais da metade. Os termos devem ser homologados por um juiz. É um respiro necessário para promover o entendimento e evitar o longo e desgastante processo da recuperação.

O parecer também abre a possibilidade de redução das dívidas das empresas com o Fisco. Podem ter desconto até de 50% nos impostos atrasados e parcelar as dívidas tributárias com a União, hoje limitadas a 84 meses e sem descontos. Pelo projeto, o parcelamento pode chegar a 120 meses. Além disso, a proposta permite a inclusão de dívidas com impostos na recuperação – hoje isso é vetado.

As mudanças não deixarem os credores, peças-chave nos processos de recuperação, de fora. Se atualmente são impedidos de apresentar um plano alternativo de recuperação, caso as propostas sejam aprovadas pelos parlamentares, agora poderão fazer isso, adaptando a legislação brasileira ao padrão internacional, como nos Estados Unidos.

A apresentação do parecer pelo deputado Hugo Leal não é o fim do longo caminho percorrido para se chegar às mudanças agora propostas. O texto foi debatido desde o ano passado com juízes, juristas, procuradores, empresários, advogados e especialistas. Não é perfeito, está aberto a sugestões e propostas. Mas é um passo importante e decisivo para o aperfeiçoamento da legislação relativa a falências e recuperações judiciais. Os processos serão mais rápidos, a negociação é estimulada e credores e devedores conquistam mais segurança jurídica e ganham mais equilíbrio. A palavra, melhor, o voto, agora está com os deputados.

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