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O dilema entre a vida e o emprego


Com o avanço do pico da pandemia de coronavírus no Brasil, o confinamento radical (lockdown) sendo adotado em três capitais – Belém, Fortaleza e São Luís e estudado em outras grandes cidades e regiões metropolitanas, as unidades do SUS já em exaustão e o sistema funerário sobrecarregado aumenta a tensão entre o setor que tenta preservar a vida dos brasileiros e o que se preocupa em manter a atividade econômica, salvar empresas e empregos.


Este não é o dilema que deveria existir no momento. Parte substancial dos brasileiros ainda não se deu conta da gravidade da doença e de seu alto grau de contaminação. Vemos todos os dias, nos variados meios de comunicação e nas redes sociais, cenas de aglomeração. Com o avanço dos casos de Covid-19 e o crescimento exponencial de mortes, São Paulo, Amapá e Pernambuco já estudam formas de ampliar as regras de isolamento social para conter a disseminação do vírus e evitar o colapso total do sistema de saúde.

Não por acaso, o prefeito do Rio, Marcelo Crivella, já baixou decreto de isolamento radical na região de Campo Grande, líder nos casos de Covid-19 na cidade. Uma decisão que foi criticada por alguns por se restringir a apenas uma área do município, mas não teve contestação nas redes sociais entre aqueles mais radicais defensores do fim das restrições à circulação de pessoas e do fechamento de setores da atividade econômica considerados não essenciais.


O governador Wilson Witzel foi aconselhado pelos cientistas da Fiocruz a decretar o confinamento radical no Estado, mas ainda não se decidiu. A prefeitura de Niterói tem pronto o ato que institui o lockdown no município nos próximos dias. O próprio ministro da Saúde, Nelson Teich, já defende o confinamento radical em algumas cidades e regiões e diz que os técnicos do Ministério montam estudo neste sentido.


Paralelamente, o presidente Jair Bolsonaro, o ministro da Economia, Paulo Guedes, e empresários estão preocupados com a retomada da atividade econômica a tal ponto que foram na quinta-feira, de surpresa, até o presidente do STF, ministro Dias Toffoli, manifestar o quanto estão tensos com a paralisação de vários setores da indústria e do comércio no país. A inesperada visita surpreendeu os ministros da Corte, mas reafirma o cotidiano discurso do Planalto a favor de uma certa relativização do isolamento social em prol da manutenção de empregos e uma recessão menos drástica no país.


Na mesma quinta-feira o presidente assinou decreto incluindo a construção civil entre os serviços essenciais, ou seja, que devem continuar funcionando mesmo em meio à pandemia. É uma das áreas que mais emprega mão de obra no país e ganhou assim o mesmo status de setores como atividades de produção, transporte e distribuição de gás natural, indústrias químicas e petroquímicas de matérias-primas ou produtos de saúde, higiene, alimentos e bebidas e atividades industriais. O texto tomou o cuidado de ressaltar que devem ser obedecidas as determinações do Ministério da Saúde.

A ideia do governo é ir, paulatinamente, incluindo outras áreas neste ranking, mas como já definiu o STF, a abertura desses setores nos Estados e municípios vai depender da decisão de governadores e prefeitos, depois de ouvir os especialistas em saúde pública. Afinal são estes governantes que lidam com o dia a dia de seus cidadãos e tem em mãos os dados que apontam o crescimento da disseminação do vírus nas cidades e Estados e a capacidade de atendimento de seus sistemas de saúde.


Não por acaso, o ministro Dias Toffoli, lembrou, na reunião com o presidente, ministros e empresários a necessidade sempre de ouvir especialista antes da retomada das atividades. E aconselhou a montagem de um gabinete de crise, incluindo governo federal, estaduais e municipais para ir debatendo a questão e definindo as melhores ações a tomar, de forma gradual e segura, para a reativação econômica.


Todos queremos voltar a trabalhar, com saúde e segurança. Não dá para trabalhar doente, nem enviar crianças doentes de volta para a escola. Todos os níveis de poder de há muito deveriam estar unidos no enfrentamento desta crise. Sabemos que é da união de esforços que surgem as melhores soluções e se traçam os planejamentos mais eficazes, especialmente diante de uma pandemia como nunca se enfrentou, porque é uma doença sem vacinas e sem remédios.


Temos mesmo de pensar no retorno à atividade. Antes, contudo, temos de salvar vidas. Sem vidas nenhuma economia avança.

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