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Emitir dinheiro, uma ideia polêmica


Cresceu durante esta semana uma discussão envolvendo o mercado financeiro, economistas e analistas em torno da emissão de moeda pelo governo para enfrentar a crise econômica deflagrada pela pandemia de coronavírus. A polêmica em torno da proposta ganhou corpo com a entrevista do secretário de Fazenda e Planejamento de São Paulo, Henrique Meirelles, à BBC. Ele considera ser este o momento de o governo federal aumentar as despesas para conter o impacto do coronavírus sobre a saúde e a economia, inclusive com a impressão de dinheiro pelo Banco Central (BC) e com a captação de recursos pelo Tesouro Nacional por meio da emissão de dívida.

Para Meirelles, a retração da economia será tão profunda (fala em PIB negativo de 5%) que afasta o risco de inflação caso o BC emita moeda para o pagamento do auxílio emergencial de R$ 600, por exemplo, aos brasileiros de baixa renda por três meses. Embora apoie a emissão de moeda e o aumento de dívida, Meirelles discorda da proposta de vender parte das reservas internacionais que o Brasil acumulou nos últimos anos. Essa ideia é defendida por alguns economistas sob a alegação de que a reversão das operações para compra das reservas em dólar reduziria o endividamento público compensando o aumento da dívida para custear o pacote anticrise. Meirelles considera que as reservas são um seguro estratégico para o país.

Imprimir dinheiro não quer dizer necessariamente dinheiro físico, aquele que a gente leva no bolso para pagar pequenas despesas hoje em dia. O BC controla a quantidade de dinheiro em circulação no mercado, nas contas correntes de empresas, dos bancos, dos clientes. Quando a atividade econômica atinge o máximo da capacidade, os preços começam a subir, vem a inflação. Então o Banco Central sobe a taxa de juros e retira dinheiro de circulação para que a atividade econômica volte a equilibrar. Agora caminhamos para uma recessão. Houve cortes sucessivos da taxa de juros. A inflação caiu significativamente. Diminuiu a quantidade de dinheiro em circulação.

Mas é preciso moeda para ajudar as empresas a superar a crise da pandemia, manter os desempregados, os que ficaram ser recursos por conta do isolamento social, atender o sistema de saúde, os Estados e municípios e a própria União que viram reduzir suas receitas e aumentar suas despesas.

Ex-ministro da Fazenda e ex-presidente do BC, Meirelles considera que o BC tem espaço para expandir a base monetária – imprimir dinheiro e recompor a economia sem risco de inflação porque é capaz de emitir sem contrair dívida. Salienta, contudo, que o conjunto de medidas econômicas para enfrentar a pandemia provocará aumento da dívida pública.

Nelson Marconi e Arthur Barrionuevo, professores de economia da FGV/EAESP, e Alvaro Bandeira, economista-chefe do banco digital Modalmais, por exemplo, concordam com Meirelles. Ernesto Lozardo, economista e professor da FGV EAESP, discorda. Considera que a proposta do secretário paulista pode elevar a dívida pública a quase 90%, como alertou ao einvestidor do Estadão. “A economia perde competitividade, o custo Brasil aumenta, a reforma tributária se inviabiliza e vai tudo para o espaço”, argumenta. Ao contrário de Meirelles, avalia que o melhor caminho seria utilizar parte das reservas internacionais (hoje está em US$ 340 bilhões) para atender as demandas emergenciais econômicas provocadas pelo vírus.

Polêmicas à parte já sabemos que o déficit primário do governo federal antes prevista em R$ 124 bilhões, já subiu para R$ 350 bilhões segundo o secretário do Tesouro, Mansueto Almeida. Como a impressão da moeda, os déficits fiscais também aumentam a base monetária e, consequentemente, o volume de dinheiro em circulação na economia, mas de forma mais controlada e diluída ao longo do tempo.

Vale lembrar que a proposta de emitir moeda para combater crises não é nova. Agora ganha espaço a do “afrouxamento quantitativo (quantitative easing, em inglês), que é criar dinheiro de forma artificial pela compra de títulos públicos ou privado. Foi o que fez o Federal Reserve, o banco central americano, que decidiu comprar títulos de hipotecas, crédito estudantil e até de veículos para conter os efeitos econômicos da pandemia.

O BC brasileiro não pode fazer isso por lei. Não por acaso, o governo prepara uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que dá mais poderes ao Banco Central em momentos emergenciais de aperto de liquidez. A instituição poderá negociar livremente com o Tesouro, e sem ajuda de intermediários, títulos da dívida pública e privada. Em última instância, esse poder permite ao BC financiar a União se for necessário. Também para tentar manter o controle dos gastos e da moeda em circulação, o presidente da Câmara, deputado Rodrigo Maia, defenda a proposta do “orçamento de guerra” paralelo, com todos os gastos relacionados ao combate do coronavírus que, entre outras medidas permite ao BC comprar e vender títulos privados de crédito, temporariamente. O objetivo é definir o que é gasto excepcional e evitar que se perpetue.

A discussão está em aberto. E o Congresso ganha protagonismo no debate.

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